O indígena
Gilmar Alves da Silva, 40 anos, se dirigia à aldeia Pambú, povo
Tumbalalá, município de Abaré, quando a moto que pilotava foi
interceptada à força por um automóvel. Com o impacto, o corpo de Gilmar
foi lançado ao chão de terra batida e alvejado por uma sequência de
tiros. O assassinato ocorreu no final da tarde do último domingo, 3, e
parte dessa história foi contada pelo próprio Gilmar, que ainda teve
forças para chegar com sua motocicleta à aldeia; e lá morrer. O assassinato é o terceiro no país envolvendo indígenas, no raio de uma semana.
A Polícia
Militar conseguiu apreender o carro usado pelo que até o momento é o
único assassino apontado como autor do crime, e que está foragido e não
teve o nome revelado pelas autoridades. No veículo, os policiais
encontraram um carregador de arma calibre 380, no qual se encontrava
cinco cartuchos intactos, além de um cartucho calibre 38, intacto, e
outras quatro cápsulas de mesmo calibre (sinal de que os tiros foram
desferidos), um revólver 38 e uma luneta para tiros de precisão.
O carro e os
armamentos foram entregues para a Polícia Civil. As informações constam
do Boletim de Ocorrência lavrado. Gilmar Tumbalalá tinha 40 anos, esposa
e quatro filhos. O corpo do indígena foi enterrado na própria aldeia,
na tarde dessa segunda-feira, 4, depois de passar por exame cadavérico
no Instituo Médico Legal (IML) de Paulo Afonso (BA). O laudo ainda não
foi concluído, por isso ainda não é possível apontar quantos tiros o
indígena levou e em quais partes do corpo. O Tumbalalá trabalhava como
motorista da Saúde Indígena de seu povo, portanto era bastante conhecido
entre os integrantes da comunidade, no Sertão baiano.
O local em
que o indígena foi emboscado fica dentro da terra indígena identificada
como tradicional pela Funai. Porém, o processo de demarcação está
paralisado. “Quando aconteceu, à tardinha, Gilmar vinha voltando do
campeonato de futebol que a Prefeitura (de Abaré) tinha promovido. Não
temos notícia de que lá tenha ocorrido uma briga, ou bebedeira, mas não
tinha só índio lá não. Ele também não tinha inimigos. A família e aldeia
estão abaladas”, afirma Socorro Tumbalalá, prima de Gilmar.
Ainda não é
possível afirmar que o assassinato tenha como motivação o conflito
agrário, mas o fato dele ter ocorrido dentro da terra indígena espantou a
comunidade Tumbalalá. A violência aconteceu e isso é incontestável.
Porém, o contexto da região é de tensão. Isso porque o projeto de uma
pequena barragem que faz parte do grande empreendimento da Transposição
do Rio São Francisco poderá colocar debaixo d´água parte do território
Tumbalalá, já identificado pela Funai. Com isso, os indígenas serão
empurrados da margem do rio para o centro da terra.
Como os
indígenas praticam um modo de agricultura onde a terra é irrigada pelas
cheias do rio, a atividade será inviabilizada caso o povo seja obrigado a
se deslocar para o interior – área ritual, de terreiros e coletas de
materiais tradicionais. No entanto, não apenas a terra seca e sagrada
espera a enxada dos indígenas. Dezenas de agrovilas do Incra foram
instaladas dentro do território Tumbalalá. São famílias de pequenos
agricultores expulsos de suas terras pelas construções das barragens de
Sobradinho e Itaparica, durante a ditadura militar. No território
indígena, esses homens e mulheres sertanejos foram reassentados pelas
mãos do Estado.
“Os
Tumbalalá vivem numa área difícil, de conflitos fundiários instalados.
Com o projeto da Transposição, tudo ficou pior. Se essas barragens
saírem, os Tumbalalá terão profundas dificuldades alimentares, por
exemplo. A outra parte agriculturável do território tradicional está
ocupado justamente pelas agrovilas. Os indígenas, então, passam a ser
uma 'ameaça' permanente a esses agricultores, estando dentro do próprio
território tradicional. A morte de Gilmar precisa ser investigada pela
Polícia Federal, o contexto exige isso”, pontua o professor de Direito e
ex-assessor jurídico do Cimi, Sandro Henrique Calheiros Lôbo
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