“Tem que apanhar para virar homem”.
Quantos mais morrerão?
Vejam a que ponto pode chegar a barbárie e a crueldade humana, fruto do preconceito, da ignorância e também de discursos de ódio proferidos das tribunas legislativas desse país.
Um garoto de 8 anos faleceu após ser espancado em Bangu, na Zona Oeste do Rio, e o próprio pai é o acusado. Segundo reportagens divulgadas pela imprensa, o pai alegou em depoimento à polícia que bateu na cabeça do filho porque ele não queria cortar o cabelo e confessou que batia com frequência no garoto para que ele “virasse homem” e para que o filho “não virasse gay” já que o menino não se enquadrava nos padrões de gênero masculino impostos pela nossa sociedade.
Esse horrível episódio me fez lembrar da minha própria infância, por volta dos 5 anos de idade, quando eu tive consciência que eu ocupava um lugar no mundo e já a partir daí eu não me identificava com as coisas consideradas de meninos; mesma idade em que a injúria se apresentou em minha vida, partindo dos adultos, inclusive de meu próprio pai, e sendo reproduzida pelas outras crianças, inclusive pelas minhas irmãs. Apelidos ofensivos, xingamentos, imitações jocosas, arremedos. Enfim, uma série de humilhações que não raramente vinham acompanhadas de violência física por parte dos adultos e das outras crianças.
Vocês conseguem imaginar quais sentimentos uma criança que é submetida cotidiana e ininterruptamente a essa situação pode nutrir sobre o mundo e sobre si mesma? Se para um adulto capaz de se defender são insuportáveis a injúria e a difamação — e muitos deles recorrem à Justiça para enfrentar a injúria e a difamação —, imaginem para uma criança! E há o agravante de que essa criança injuriada não conta com proteção nem defesa alguma na escola. Muito pelo contrário, as humilhações ali se multiplicam, sendo que os professores muitas vezes culpam a criança pelas humilhações que ela sofre.
Infelizmente este garoto de Bangu teve-lhe retirado o direito à vida por meio de um crime brutal, crime fruto do preconceito e da ignorância do pai que não compreende a diferença entre orientação sexual, gênero e identidade de gênero; um crime que é fruto também de discursos de ódio de Deputados Federais, Senadores, Deputados Estaduais e Vereadores – discursos direcionados contra quem foge do comportamento social de gênero e sexualidade que nos são impostos – e que trabalham para negar a cidadania plena para a população LGBT.
Discursos como o de um deputado federal fluminense, um vestígio do fascismo que esteve no poder durante as mais de duas décadas de ditadura militar, que propaga aos quatro cantos, sob proteção da imunidade parlamentar, que nenhum pai tem orgulho de um filho gay e que um filho gay deve apanhar para aprender a “ser homem”; esta é uma das muitas frases utilizadas por parlamentares para provocarem e falarem fundo nos preconceitos da população. Nós temos que desmoralizar e desconstruir estas figuras em nome de um país democrático e da livre convivência dos diferentes.
Solidarizo-me com a família do garoto e coloco o meu mandato à disposição para o que necessitarem; apesar da dor que sinto no momento com essa triste morte de um criança que tinha toda uma vida pela frente, façamos da dor uma força nessa nossa luta para que, um dia, casos como este não mais ocorram.
Isso precisa mudar. Urgente!
Do Blog do DEPUTADO JEAN WYLLYS
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