Artigo
Reforma Urbana, já! A cidade que a gente quer se consegue na luta. Por Helena Silvestre
As jornadas de junho colocou o tema da mobilidade urbana no centro da agenda a partir da luta pela redução das tarifas. O controle dos cartéis do transporte e sua relação promíscua com o Estado vieram à tona a partir das denúncias de desvio de dinheiro público. Temas como a estatização dos transportes, a tarifa zero e o passe-livre vieram ao primeiro plano.
Mas, junto com isso, outras reivindicações foram entrando no cenário das lutas, especialmente às que exigiam mais e melhores serviços públicos, como é o caso da saúde e educação. Isso trouxe à tona toda problemática da chama “crise urbana”.
No entanto, existe outra reivindicação, que é parte intrínseca dessa mesma luta, que precisa ser colocada com mais centralidade na agenda dos movimentos sociais: trata-se da luta pela reforma urbana. Uma luta muito importante, particularmente para as camadas mais pobres da nossa classe.
Todas essas reivindicações, evidentemente, se chocam frontalmente com o modelo de cidade vinha sendo implementado pelo PSDB, mas que, infelizmente, seguiu se aprofundando sob os governos do PT: uma cidade a serviço dos negócios dos capitalistas. Não por outro motivo que agora, as mobilizações de junho atingiram todos os governos, sem diferenciação. Isso exige não só reflexão, mas também uma nova atitude dos movimentos populares.
A questão urbana no centro da agenda
Não é de agora que muitas discussões acontecem nos meios militantes, de esquerda, intelectuais e outros, sobre os rumos da cidade: Como ela se desenvolve, com que perspectivas e pra quem.
É parte da história das mais importantes lutas do Brasil, a participação de movimentos populares: os movimentos de moradia, os movimentos populares de saúde, os clubes de mães, os movimentos contra a carestia que foram atores dos enfrentamentos que construíram – em unidade fortíssima com o movimento sindical – nossas bases nas décadas de 70 e 80.
Afinal, a divisão sindical e popular não é algo natural da classe, é também uma divisão burguesa que compartimenta os problemas de nossa vida em secretarias, ministérios, subprefeituras, categorias etc.
Temos ainda um longo caminho a trilhar e muitos erros deverão ocorrer, mas só erra quem tenta e nós tentamos e tentaremos muito, até conseguir!
Neste período que se abriu no Brasil, de lutas muito massivas e populares em junho, e greves e retomada da luta dos trabalhadores em julho, vemos como tudo está tão ligado, o quanto somos uma só classe, explorada no trabalho e na vida toda.
O tema do transporte foi o estopim de outro debate: o de como é que as cidades vêm sendo produzidas sob o signo da lógica do lucro e da humilhação e degradação das vidas dos mais pobres.
O nível insuportável a que chegou o tema da mobilidade urbana explodiu em lutas massivas, mas há também o gravíssimo problema da super concentração populacional das cidades, do monopólio das propriedades urbanas vazias nas mãos dos especuladores, da subida no preço dos aluguéis, da militarização do espaço urbano como controle social da miséria, do sucateamento dos serviços públicos com ênfase na saúde e educação públicas.
É preciso pautar com centralidade a luta pela reforma urbana
Há muitas organizações e movimentos que adaptaram seus princípios e suas formas de luta aos governos – mais que tudo aos governos petistas – e deixaram-se levar (não sem benefícios pessoais a algumas lideranças) pelo enganoso canto da sereia traduzido em conselhos, fóruns, conferências e programas que não alteram estruturalmente a vida dos trabalhadores, porque não toca nos interesses dos mega- empresários da construção civil, dos especuladores imobiliários, das máfias do transporte, e da saúde e educação privadas. Não por acaso nem mesmo o próprio Estatuto da Cidade – comemorado como vitória por amplos setores de esquerda e por intelectuais – vem sendo aplicado. O que avança de fato é o urbanismo de negócio.
Infelizmente, ainda que façam lutas, estes movimentos ficam limitados às migalhas oferecidas pelos governantes num espetáculo onde o povo mais pobre é apenas o espectador de sua própria miséria.
Nós, que sabemos exatamente que tudo isso não mudará a vida dos milhões que vivem precariamente, que são humilhados no transporte como gado, que morrem nas filas dos hospitais, defendemos um projeto de cidade dos trabalhadores, uma cidade que se organiza sob a lógica da vida, do desenvolvimento humano, da não concentração, da democracia ampla e direta dos trabalhadores que são exatamente aqueles que produzem toda essa riqueza que se concentra fora de suas mãos.
Para avançar na construção da cidade que queremos uma verdadeira reforma urbana se faz urgente. Uma reforma que tope de fato com os interesses capitalistas, que se atreva a dizer não aos interesses dos mais ricos para poder dizer sim àqueles que tudo fazem e nada tem.
É preciso que os movimentos sociais organizem uma jornada de luta que, dentre outras reivindicações, coloque em pauta: a) a expropriação imediata de todas as áreas vazias que tem dívidas com o poder público para fins de reforma urbana; b) a desapropriação de todas as áreas subutilizadas; c) o controle estatal dos preços dos aluguéis; d) a formação de Conselhos Populares que decidam sobre a política urbana em assembleias populares massivas e não no engodo das conferencias engessadas.
Somente assim, poderemos conquistar uma vida melhor para quem tudo produz! A cidade que a gente quer se constrói na luta!
Por Helena Silvestre, do Movimento Luta Popular
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